terça-feira, 21 de setembro de 2010

SCHOPENHAUER


 

Há 150 anos falecia Schopenhauer, filósofo das contradições

Em 21 de setembro de 1860 morria em Frankfurt do Meno um dos mais influentes pensadores do século 19. Uma figura marcada por contradições e anedotas, porém sem a qual Wagner, Nietzsche e Thomas Mann seriam impensáveis.


Obit anus, abit onus: A velha morre, a carga se vai.
A frase consta do livro de contas de um certo senhor alemão do século 19. Mais de 20 anos antes, ele machucara seriamente, numa briga, o braço de uma costureira, sendo condenado a pagar-lhe uma pensão vitalícia. Agora, por fim, com a morte da ex-vizinha, a despesa estava quitada.
Tanto a história como seu final não soam nada nobres, muito menos para um filósofo. No entanto, assim era Arthur Schopenhauer (1788-1860): um homem de extremos e contradições.

Teoria e prática
Nos atos, um Don Juan, nas ideias, um misógino, seu julgamento sobre o matrimônio era sumário: "Casar-se significa agarrar um saco, de olhos vendados, e rezar para que se ache uma enguia em meio a um monte de cobras". Além disso, por melhor que um casamento fosse, ele sempre resultava em "reduzir à metade os próprios direitos e duplicar as obrigações".
Em contrapartida, Schopenhauer foi um dos primeiros europeus a se baterem pelos direitos dos animais. E admirava os vegetarianos da Índia, embora ele mesmo comesse carne e estivesse longe de ser um asceta.
Nascido em 22 de fevereiro de 1788 em Danzig (hoje Gdansk, na Polônia), Arthur Schopenhauer cresceu em Hamburgo e conheceu a Europa viajando com seus pais. Assim descreve o biógrafo Rüdiger Safranski a trajetória do pensador:
"O pai, um rico empresário, queria que ele fosse comerciante. Schopenhauer tornou-se filósofo, beneficiando-se da morte do pai e com a ajuda da mãe, que ele mais tarde trataria como inimiga". Fato é que a fortuna herdada permitiu ao solteirão viver para a filosofia, e não dela, como os professores universitários que ele tanto odiava.
Influências orientais
Tal independência em relação a instituições ou mecenas certamente favoreceu a agudeza de seu olhar sobre o mundo e a existência, sintetizada em inúmeros aforismos como: "Para não ser infeliz demais, o meio mais seguro é não exigir muita felicidade".


O escritor Thomas Mann definiu Schopenhauer como "o mais racional filósofo do irracional", outros o tachariam de pessimista, niilista, rabugento. Em sua obra-mestra, O mundo como vontade e representação (Die Welt als Wille und Vorstellung) – concluída em 1818, e que se encerra com a palavra "nada") –, ele anuncia haver solvido o enigma da existência.
O resultado é bem pouco alvissareiro: toda biografia é "uma história de dor", o livre arbítrio é uma ilusão, e o homem um ser à mercê das próprias emoções e desejos. Porém há como encontrar consolo e paz interior em meio à realidade dolorosa: através da ascese ou tentando minorar a dor dos outros. Compaixão, para Schopenhauer, é "o único verdadeiro motor moral".
Tal atitude deveria bastar para libertar o filósofo do epíteto de pessimista. Sua fixação nos temas sofrimento e redenção também se origina na leitura de textos budistas e hinduístas: ele foi um dos primeiros pensadores europeus a se deixar inspirar pela sabedoria do Extremo Oriente.
O amor e os poodles
Uma influência que se estenderá a filósofos e artistas como Friedrich Nietzsche, Leo Tolstoi, Hermann Hesse ou Richard Wagner. Este último, após ler O mundo como vontade e representação, aprofundou as noções de negação do mundo e de dissolução no amor, que permeiam todas as suas subsequentes óperas, de Tristão e Isolda a Parsifal. Não por acaso, o compositor dedicou a Schopenhauer seu libreto para a tetralogia O anel do Nibelungo.

Na fruição das artes plásticas e da música, Schopenhauer via o caminho para a paz da alma. Através do "prazer estético do belo", toda vontade, desejo, preocupações se desfazem. A arte é uma das raras fontes de luz e consolo em meio à noite da existência mundana.
A arte e a compaixão: "A bondade do coração consiste numa compaixão profundamente sentida, universal com tudo que tem vida". Um princípio que o filósofo aplicará, em especial, aos cães. Seus últimos anos – em Frankfurt, onde faleceria a 21 de setembro de 1860 – o encontram passeando às margens do rio Meno, com algum de seus numerosos poodles, com quem conversava em inglês.
Estes se chamavam simplesmente "Butz", um nome genérico, ou "Atman" – "sopro", "respiração" em sânscrito. Os poodles de Schopenhauer eram, portanto, a "alma do mundo" sobre quatro patas. E quando se comportavam extremamente mal, o filósofo só tinha um insulto: "Homem!!!".
Autor: Augusto Valente
Revisão: Carlos Albuquerque
 Fonte: Cultura - DW
http://www.dw-world.de/dw/article/0,,6029990,00.html?maca=bra-newsletter_br_Destaques-2362-html-nl

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